Revista F@ro Nº2

A Mídia e a Transparência das Imagens

Alberto Klein1
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Resumo: Este trabalho propõe-se a analisar a presença de uma forma de mediação arcaica que denominamos "transparência das imagens" em cenas do cotidiano midiático atual. Tal fenômeno constitui-se semioticamente pela tomada do signo pelo objeto, sem que se defina claramente seus limites. Assim, abordamos como a transparência se manifesta no paleolítico, no simbolismo das imagens religiosas, bem como em programas de televisão e na publicidade.

Palavras chave: imagem, transparência, semiótica, símbolo.

Introdução

Em certa ocasião, quando um
artista europeu fez desenhos do gado de
um vilarejo africano, seus habitantes protestaram:
"Se você os levar, do que viveremos?"
(E. H. Gombrich - The Story of Art).

Em diferentes culturas, a mediação de imagens circunscritas ao sagrado, por seu caráter simbólico, propicia uma espécie de diluição dos limites entre signo e objeto, fazendo crer que a experiência da imagem converta-se na experiência do próprio sagrado.

A disposição do espírito humano de estabelecer esse compromisso mágico com o universo das imagens evidencia-se desde o paleolítico, mesmo que qualquer retroprojeção a um período pré-histórico imponha alguns riscos quanto à reconstituição do comportamento de nossos ancestrais. Todavia, é com segurança que pesquisas, como a do paleontólogo André Leroi-Gourhan (s/d), atestam a presença da centelha religiosa desde o paleolítico, além de gerar suposições sobre os temas mitológicos das imagens de Lascaux e Altamira. É este caminho trilhado por Edgar Morin, em "O Paradigma Perdido?", ao tratar da gênese do imaginário humano e do compromisso mágico estabelecido com o homem.

Assim, o mundo exterior, os seres e os objetos do ambiente, adquiriram, com o Homo sapiens, uma segunda existência, a existência de sua presença no espírito fora da percepção empírica, sob a forma de imagem mental, análoga à imagem que forma a percepção, visto que não se trata senão dessa imagem relembrada. Daqui em diante, todo significante, incluindo o sinal convencional, transportará potencialmente a presença do significado (imagem mental), e este último poderá confundir-se com o referente, isto é, com o objeto empírico designado. São, evidentemente, o desenho e a pintura "realistas" que levam à perfeição a adequação entre o significante, por exemplo, um bisonte, a imagem mental do bisonte e o bisonte empírico (s/d: 99).

Embora os comportamentos mágicos não sejam de todo fossilizáveis, Morin acredita que independentemente da cultura e da época, "os fenômenos mágicos sejam potencialmente estéticos e que os fenômenos estéticos sejam potencialmente mágicos". Tal argumento põe um fim na polêmica discussão sobre as intenções puramente estéticas ou puramente mágicas nas imagens pré-históricas.

A frase de Morin nos serve também como ponto de partida na busca de indícios mágicos nesta comunhão selada entre o homem contemporâneo e as imagens midiáticas. Neste sentido, o objetivo deste paper é procurar aproximações deste tipo de mediação mais arcaica em fenômenos midiáticos da atualidade, considerando a possibilidade do que denominamos "transparência" das imagens. Por transparência entendemos a aparente ausência mediadora do suporte técnico da imagem, de maneira que o objeto por ela representado se faz sentir imediatamente, produzindo efeito direto e significativo.

O ocultamento do signo pelo referente manifesta-se sobremaneira no universo da religião. Neste domínio, toda consideração sobre as imagens carrega a tensão sobre qual é a sua natureza e qual deve ser o seu papel diante do Sagrado. Especialmente, na tradição judaico-cristã, a tensão emerge desde o interdito da Lei Mosaica a respeito de se fazer imagens de escultura sobre o que há nos céus, na terra e embaixo da terra. Dar visibilidade ao Sagrado através das imagens, tornar o Divino, de alguma maneira, apreensível aos olhos, foi uma prática adotada pelo Cristianismo, mais fortemente a partir do quinto século, mesmo com a reprovação dos primeiros teólogos, que temiam a adoção de costumes pagãos no seio da Igreja. Neste contexto, é bastante significativa a frase de uma mulher do sexto século, dona de uma imagem miraculosa de Cristo chamada Kamuliana: "Como posso adorá-lo se ele não é visível, se não o conheço?" (Belting, 1996: 145)2.

O que sempre esteve em jogo no Cristianismo foi o status semiótico da imagem. Seus limites em relação ao objeto representado nunca foram precisos no âmbito da religião, fazendo levantar posições diversas sobre se a um ícone dever-se-ia prestar culto. De um lado, espalhava-se no povo (em Bizâncio, especialmente), a atitude de tomar a imagem como algo estreitamente vinculado ao poder divino. Através delas, Deus se manifestava e à imagem era conferida uma porção daquilo que ela representava. De outro, não faltaram aqueles que tentaram distanciar signo e objeto, denunciando a falácia do poder das imagens, tentando restaurar a interdição mosaica. Esta última postura foi levada às últimas conseqüências, pelo menos, em dois célebres períodos de iconoclasmos (quebra de ícones, literalmente). O primeiro deles ocorrido no século VIII, no Império Bizantino, que foi superado pelo Segundo Concílio de Nicéia, primeiro documento oficial da Igreja que encorajava o culto às imagens. O segundo teve a Europa ocidental como palco e foi deflagrado pela Reforma do século XVI, sob os auspícios de Zuínglio e Calvino (Lutero não era iconoclasta). A fúria dirigida às imagens em Genebra (exposição de ícones sem cabeça em praça pública) evidencia mais do que o desejo de superação do poder das imagens, mas também o ímpeto de castigá-la, o que talvez seja uma forma de encantamento às avessas. De qualquer maneira, o protestantismo representou a deposição da imagem pela palavra.

1. Transparência e Imagens Simbólicas

Na dimensão mágico-religiosa, a transparência da imagem se assume por seu caráter simbólico. Símbolo aqui deve ser compreendido no seu aspecto mais radical de proximidade entre o aspecto material do signo e o sentido que ele carrega. Assim, é oportuno retomar a origem da expressão grega symbolon (lançar juntos). O sentido original designa um objeto partido ao meio, cuja posterior união entre suas duas metades servia de senha para o estabelecimento de um novo contrato. Nesta perspectiva, a imagem simbólica implica uma união profunda e perfeita entre a metade imagem e a metade objeto. Sela-se uma relação em que a imagem é tomada como parte pelo todo. Ela se constitui, portanto, pelo seu poder revelador, mágico e epifânico. Sem nos lançarmos na tentativa de dar os contornos do conceito de símbolo, uma vez que este não é o objetivo deste trabalho, é apropriado dar voz ao estudioso francês Gilberd Durand:

Dado que a re-presentação simbólica nunca pode ser confirmada pela representação pura e simples do que ela significa, o símbolo, em última instância, só é válido por si mesmo. Não podendo figurar a infigurável transcendência, a imagem simbólica é transfiguração de uma representação concreta através de um sentido para sempre abstrato. O símbolo é, pois, uma representação que faz aparecer um sentido secreto, é a epifania de um mistério (1993: 12).

Gilbert Durand também denuncia todo esforço da civilização ocidental em esvaziar as imagens simbólicas através de uma série de iconoclasmos, mais sutis do que aqueles que já citamos. O exemplo mais evidente seria o cientificismo extraído do cartesianismo que, de certo modo, orientou todo pensamento científico moderno, impôs limites rígidos à construção do conhecimento e relegou a arte (terreno fértil às irrupções simbólicas) à condição de ornamento ou divertimento. É em tom melancólico que Durand ainda hoje observa este panorama: "E na anarquia pululante e vingativa das imagens que sutilmente varre e submerge o século XX, o artista procura desesperadamente ancorar sua evocação para lá do deserto cientista da nossa pedagogia cultural" (1993: 23).

2. O Vazio das Imagens Cotidianas

O esvaziamento das imagens pode também ser detectado pela alta exposição das imagens midiáticas. Paralelamente à sucessão dos iconoclasmos, observamos, como já sinaliza Durand com a "anarquia pululante e vingativa das imagens", um acelerado desenvolvimento técnico das mídias visuais. A disseminação e os usos sociais dos mais diversos suportes técnicos de informação fizeram com que o século XX mergulhasse em um oceano de imagens. Em que medida o excesso significa também a perda de símbolos diretores é um dos questionamentos suscitados por Norval Baitello Júnior, no texto "Ocidentação: a perda dos símbolos diretores e o esvaziamento das imagens" (no prelo). Walter Benjamin sinalizava esta situação em seu famoso ensaio "A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica", ao tratar da perda da aura em uma obra de arte projetada de antemão para a reprodutibilidade, bem como pela ascensão do valor de exposição sobre o valor de culto.

Com a oferta excessiva de imagens no cotidiano do homem contemporâneo, inverteu-se o movimento na relação entre imagem e olhar. Este encontra cada vez menos situações em que é convidado a mover-se, perscrutar, projetar-se sobre a superfície. Pelo contrário, a onipresença midiática figura-se como um turbilhão de imagens que avança e colide com a órbita ocular. A violência da colisão só pode ser amortecida pela recusa, pelo fechamento dos olhos, enquanto estes esperam em vão por paisagens desmediatizadas. O filósofo alemão Dietmar Kamper descreve uma situação de padecimento dos olhos: "Os olhos já não acompanham; seja pela abundância de imagens, seja pela acelerada aparição e desaparição das coisas (...). A órbita ocular (...) tornou-se estúpida. Quase tudo passa por ela, mas ela não mais se detém ou não retém mais nada" (1997: 132).

3. Técnica e Ilusão

Não obstante a marginalidade do simbolismo e a perda de sentido das imagens, ainda é possível detectar um esforço de reencantamento do olhar. Assim, o fenômeno da transparência da imagem inscreve-se no contexto midiático tendo como fim a ilusão do olhar, através do aperfeiçoamento técnico dos meios. Iludir não no sentido de mentir ou enganar, mas recobrando seu significado original de "entrada em jogo" (in lusio). O olhar é instado a participar de um fenômeno em que se brinca com os limites entre o signo e o objeto, entre um acontecimento e sua representação na tela. Aqui, um conceito que se alia ao de ilusão é o de imersividade, que ganhou destaque com o surgimento das tecnologias de Realidade Virtual (RV). As mídias imersivas são aquelas que se definem por sua capacidade cobrir o espectro sensorial humano, lançando-o a uma proposta interativa com o universo da imagem. O objetivo de muitas tecnologias de RV é literalmente entrar na imagem.

Muito aquém da Realidade Virtual, o historiador da arte Ernst H. Gombrich (2000) identificara mecanismos de criação da ilusão na pintura desde o Renascimento, como luz e perspectiva. O olhar do artista assemelha-se, portanto, ao do cientista, procurando decifrar a natureza e transpô-la para a tela. O pintor inglês do século XIX, John Constable, que perseguia o máximo de realismo em suas pinturas, assim se expressava a respeito de seu ofício: "A pintura é uma ciência e deve ser tomada como uma investigação das leis da natureza. Por que, então, a pintura de paisagens não pode ser considerada um ramo da filosofia natural (física), da qual os quadros não são senão experimentos?" (apud. Gombrich, 2000: 33) 3. Os limites da semelhança da pintura iriam pouco depois serem colocados à prova pelo surgimento da fotografia.

No contexto da cultura de massa, a ilusão dá um salto com o avanço técnico dos meios eletrônicos. A relação que o homem estabeleceu com esses meios muitas vezes não é tangenciada pela razão. A transmissão de um contagiante jogo de futebol pela televisão, por exemplo, pode levar um telespectador a gritar com jogadores, juiz, técnico, como se o mecanismo de mediação fosse temporariamente suspenso. No Brasil, a popularidade das telenovelas faz com que atores sejam confundidos com seus papéis, a ponto de alguns chegarem a ser agredidos publicamente no lugar de seu personagem.

Neste sentido, o cientista da mídia alemão, Harry Pross (1980), pondera sobre a tentativa dos meios, mediante a perfeição técnica, de não se fazerem visíveis, levando-nos a uma apropriação imediata de seus conteúdos. Com isso, a transparência midiática das imagens implica um redirecionamento a essa forma mais arcaica de mediação, sem que se alcance, todavia, seu ponto mais profundo de experiência mística. A transparência, desse modo, evidencia-se mais pelo seu poder técnico de gerar ilusão do que propriamente pelo seu caráter mágico e religioso. De qualquer modo, os limites semióticos do signo e do objeto borram-se mais uma vez.

A magia e a religiosidade, todavia, insinuam-se aqui e ali nos programas de televisão, dotando o pixel (unidade mínima de imagem) de um poder único. Um caso exemplar de vínculo entre a técnica e magia foi patrocinado pelo paranormal israelense Uri Gheler que, na década de setenta, ficou famoso por "realizar" consertos de relógios de telespectadores, colocados em cima do aparelho televisor. No âmbito religioso, tornou-se prática comum entre padres carismáticos e pastores de igrejas pentecostais a realização de milagres por meio da televisão. Antes de orar pelo milagre, solicitam aos telefiéis que coloquem um copo de água sobre seus aparelhos, pretendendo que a intervenção divina ultrapasse os limites do meio e cheguem ao telespectador por ondas eletromagnéticas. A gravação prévia de muitos programas religiosos também não impede que busque o milagre na atemporalidade do videotape.

Logo em seguida à morte do Papa João Paulo II, a imprensa divulgou relatos de milagres do novo postulante à canonização, que teriam ocorrido através da transmissão de sua imagem na televisão. Trata-se do exemplo mais claro de como a televisão assenhorou-se do poder das imagens religiosas. Não se trata aqui de questionar a eficiência do milagre ou a fé dos telespectadores, mas sim de mostrar uma nova modalidade de relação entre a religiosidade contemporânea e a imagem midiática. Estes exemplos nos indicam que as imagens ainda procuram tecer relações mágicas, preservando a ambivalência da presença/distanciamento de seu objeto, seja qual for o seu suporte. Na era da revolução midiática, onde as relações constroem-se cada vez mais mediante aparatos tecnológicos, é perfeitamente compreensível que as manifestações mágicas e religiosas, que sempre permearam os vínculos humanos, migrem para esses novos espaços. Os contornos dessa nova religiosidade midiática estão apenas se tornando mais claros.

Fora dessa aliança que se perpetua entre religião e mídia, encontramos outros horizontes de transparência. É o caso da publicidade, que, acusada freqüentemente de poluir excessivamente nosso ambiente com imagens fragmentárias, se vê diante do desafio constante de reencantar um olhar anestesiado. Na publicidade externa, notamos cada vez mais a presença desse modelo de mediação, como se as imagens midiáticas não se contentassem apenas em "representar" algo, mas, sim, em "presentificá-lo". É que avistamos em cenas do cotidiano midiático urbano. Diante da pasmaceira e da mesmice dos outdoors, percebemos tentativas criativas que se destacam na selva midiática. Em 1999, a agência DPZ, em São Paulo, pendurou um carro afixando suas quatro rodas sobre a tela de um outdoor. Ao lado a inscrição: "Nenhum carro agarra mais no asfalto do que um Subaru". A peça joga com os limites representacionais da imagem, dando um aspecto hierofânico ao veículo, cuja aparição remete-nos claramente a textos ligados ao universo da magia e da religião. Outras campanhas, adotando uma linha semelhante, além de automóveis, já se investiram na restituição da confusão mágica entre signo e objeto, pendurando pessoas e objetos. O objetivo é restaurar a visibilidade de um espaço urbano tão saturado de informações visuais, que faz naufragar, paradoxalmente, na invisibilidade todas as suas imagens, como afirma Norval Baitello Júnior (2003:80). As novas investidas das imagens apostam na transposição da imagem para fazer emergir o próprio referente, ou, de outro modo, na submissão do referente à condição de imagem de si mesmo. Seja qual for a melhor descrição, é possível afirmar que o paleolítico ainda sobrevive em nosso universo midiático.

A partir dessas considerações, procuramos lançar as seguintes hipóteses. Primeira: a mediação pela transparência é resquício e sinal de que a imagem, como presença duplicada, sempre encontrará espaço para sua sobrevivência, por se caracterizar como uma estrutura permanente do Homo sapiens. Edgar Morin, neste aspecto, empregaria a expressão Homo demens, para designar a face do sapiens mais afeita ao excesso, à magia, ao entorpecimento, que acabou quase sempre obscurecida pela face racional, sisuda e inteligente que se deduz da expressão Homo sapiens. Segunda: a transparência corresponde paradoxalmente à tentativa das imagens midiáticas cotidianas de se fazerem visíveis aos olhos humanos. Há, neste sentido, uma tentativa de ultrapassar o vazio das imagens cotidianas, uma busca pelo reencantamento do olhar, padecido, como nos alerta Kamper, pela sua falta de mobilidade diante da presença excessiva das mídias visuais em nossa sociedade. No lugar de conclusões, estas duas hipóteses colocam-se como ponto de partida para uma análise mais abrangente que deve ser levada sobre o papel das imagens no mundo contemporâneo.

Fusão/confusão do signo e referente aproxima-se da noção de simulacro de Jean Baudrillard. A transparência das imagens na cena midiática representaria apenas mais um sofisticado mecanismo de liquidação de todos os referenciais, tal como foi diagnosticado por Jean Baudrillard em seu "Simulacros e Simulação". Assim, com a diluição dos limiares semióticos pela transparência, ficaríamos na mesma condição, descrita pelo pensador francês, de não conseguir mais enxergar o território por detrás do mapa. Esta ambivalência da imagem constitui-se como uma figura clara do borramento da realidade com suas formas de representação, ou seja, a hiper-realidade. Ela se torna expressão de uma de uma vida social que se reduz à bidimensionalidade das telas e que, mesmo em sua materialidade, se constrói inspirada nas matrizes midiáticas. Dessa maneira, a transparência evidencia-se como um simulacro quando as imagens definitivamente tornam-se mais significativas do que seu referente, assumindo totalmente o seu lugar. Como aventamos acima, o simulacro está na natureza das formas religiosas que não somente crescem pela televisão, mas também se delineia com uma estética televisual.

4. Os Riscos do Iconoclasmo e o Desenho do Labirinto

Se a transparência for encarada como um problema, haveria saídas para ultrapassar as imposturas da imagem? Em que medida, a visão iconoclasta seria ainda válida para denunciar as estratégias de tornar transparentes as imagens para fins encantatórios? Afinal, esta tentativa de reencantar o olhar teria como fim último o mercado. Quais seriam os riscos dos iconoclastas incorrerem, tal como os da Reforma do século XVI, na "demonização" das imagens, o que significaria cair na mesma armadilha? Os iconoclastas, ao dirigir sua violência contra as imagens, acabam por reiterar um poder inerente às mesmas, ignorando que o alvo a ser atingido é a mente humana e sua disposição de conferir poder e autoridade às suas produções imaginárias. Portanto, iconoclasmos são armadilhas cuidadosamente preparadas pela astúcia das imagens que criamos.

Com este paper, pretendemos suscitar problemas decorrentes dessa nova (e ao mesmo tempo arcaica) condição mediadora das imagens midiáticas. Não procuramos saídas do labirinto de imagens, mas, pelo menos, iniciamos uma busca para entender melhor seu desenho. Deslindar a transparência seria o primeiro passo para esquadrinhar o labirinto. O antropólogo da imagem, Hans Belting, fornece-nos uma chave importante para compreender o papel da imagem na sociedade e na cultura: "O gênero humano nunca se viu livre do poder das imagens, mas este poder tem se exercido por diferentes imagens, de diferentes formas e em diferentes períodos" (1996:16)4.

Talvez, a primeira pista para compreender o mapa do labirinto de imagens seja reconhecer a condição humana diante das imagens: o homem não somente como produtor, mas também como seu produto. Imaginá-las não somente como fruto do sonho do homem, mas imaginarmo-nos inversamente como fruto dos sonhos das imagens. Esta última possibilidade deve ser entendida como uma metáfora possível do impacto profundo da imagem na cultura. Nesta vinculação da imagem com o imaginário e a mídia, serve de inspiração a metáfora da tríade dos sonhos de Dietmar Kamper: "Deus sonha os homens; o homem sonha as máquinas; as máquinas sonham Deus. Todos os três sonhos são fundamentais; todos seguem juntos. Eles esgotam a imaginação e deixam ao mundo uma órbita de detritos imaginários" (2004, p.7).

Referencias bibliográficas

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PROSS, Harry (1980) Estructura simbólica del poder. Barcelona: Gustavo Gili.


Notas

1 Professor do Programa de Mestrado em Comunicação e Linguagens da Universidade Tuiuti do Paraná (Curitiba - Brasil) e pesquisador do Centro Interdisciplinar de Semiótica da Cultura (São Paulo).

2 Tradução do autor.

3 Tradução do autor.

4 Tradução do autor.


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Revista teórica del Departamento de Ciencias de la Comunicación y de la Información
Facultad de Humanidades - Universidad de Playa Ancha
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